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segunda-feira, outubro 24, 2005

Segundona braba

Pela segunda semana seguida a lista dos livros mais vendidos de ficção do Globo não traz um título brasileiro sequer. Acho que vale um grande debate sobre a questão, que, a meu ver, é gravíssima, e é paralela ao fato das vendas de livros estarem decaindo no país.

Difícil comparar mercados, mas alguém imagina uma lista de cds mais vendidos sem nenhum brasileiro? Tá bom, essa não é uma comparação justa. Mas e no caso do cinema, que os nacionais concorrem diretamente com os blockbusters americanos, os cults europeus e a máquina de propaganda envolvida? A situação dos filmes nacionais também é desfavorável, mas mesmo assim, nos últimos anos, temos fitas brasileiras muito assistidas - mesmo que para isso a Globo Filmes tenha que ter crescido.

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Algo me irrita profundamente nos suplementos literários do Rio. Essa capacidade de adjetivar cada livro como se fosse um clássico, conto como pérola, romance sendo promissor. Tá demais, meus caros.

Chega dessa hermafroditização de classe. Fica um lambendo a bunda do outro para este devolver o elogio mais tarde. Parece que as resenhas são feitas para benefício próprio. Eu, hein.

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Kléber Leite, Joel Cachaça, Júnior Baiano. O Flamengo hoje em dia é um clube do mundo bizarro. Parece que voltamos no tempo para repetir os próprios erros. Só falta chamarem também o Hélio Ferraz, o presidente que ia se aposentar e escrever um livro de contos eróticos.

segunda-feira, outubro 03, 2005

Bravo, Kosinski

Na Ilustrada de sábado soube que a Ediouro está relançando 'O Videota', de Jerzi Kosinski. É uma ótima notícia, pois é um livrinho bastante simpático. Alguns devem conhecer a história, já que o livro virou filme, protagonizado pelo Peter Sellers.

Porém, o que vale mesmo é que o relançamento de 'O Videota' pode significar uma nova edição de 'O Pássaro Pintado', obra prima de Kosinski, que afirmo, sem nenhuma dúvida, ser um dos três livros mais impressionantes que já li.

Kosinski alia uma narrativa poderosa - um menino de pele escura vaga de aldeia em aldeia pela Europa Cental durante a Segunda Guerra, e vivencia as piores crueldades - com uma prosa estilisticamente impecável, onde mesmo as cenas mais brutais são narradas com uma beleza ímpar.

A edição que tenho, bastante antiga, é da Nova Fronteira (que recentemente foi comprada pela Ediouro), com tradução de Marina Colassanti e Christiano Oiticica.

Abaixo, uma passagem estarrecedora do livro, que justifica o título numa metáfora belíssima:

"Às vezes passavam-se dias sem que Ludmila a Idiota aparecesse na floresta. Uma raiva silenciosa apossava-se de Lekh, que, murmurando de si para si, fixava longamente os pássaros nas gaiolas. Afinal, após demorados estudos, escolhia o passáro mais forte, amarrava-o ao pulso, e, misturando os mais variados ingredientes, preparava tintas fétidas de diferentes cores. Quando estas os satisfaziam, virava o pássaro e pintava-lhe as asas, a cabeça e o peito um tons brilhantes, até tornál-o mais colorido do que um buquê de flores silvestres.

Íamos então para a parte mais densa da floresta, Lekh me entregava o pássaro pintado, mandando que eu o apertasse de leve nas mãos. Cedo seus gritos atraíam companheiros da mesma espécie, que se punham a revoar sobre nossas cabeças. Vendo-os, o prisioneiro debatia-se gritando ainda mais, e o coraçãozinho, trancado no peito recém-pintado, batia violentamente.

Quando o número de pássaros era suficiente, Lekh fazia-me um sinal para soltar o prisioneiro. Livre e feliz, lançava-se para o alto, pequeno arco-íris contra o seu cinzento, mergulhando na revoada escura de seus irmãos. Por um instante a surpresa tolia os pássaros. A mancha colorida voava em meio ao bando, tentando convencê-los de que lhe pertencia. Mas, confundidos pela plumagem brilhante, os outros os rodeavam incrédulos e quanto mais o pássaro pintado tentava incorporar-se ao bando, mais o rejeitavam. Logo, um depois do outro, começavam a atacá-lo, arrancando-lhes as penas multicolores, até fazer-lhe perder as forças, precipitando-o ao chão.

Estes incidentes aconteciam com freqüênciam, e, geralmente, quando recolhíamos o passáro pintado já o encontrávamos morto. Lekh examinava atentamente as feridas. Por entre as asas coloridas o sangue gotejava diluindo a pintura e manchando-lhe as mãos."

O riso por trás do sexo

Fiz uma resenha-matéria sobre Umidade, novo livro do Reinaldo Moraes. Saiu na edição de hoje, 3 de outubro, do JB. Aí está o link.

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